Operações militares, mesmo em tempos de paz, podem trazer resultados de forte repercussão tanto para forças armadas quanto para a indústria de defesa. E essa é, precisamente, a descrição da Operação Samaúma, concluída este mês, que consolidou a capacidade dos caças F-39E Gripen da Força Aérea Brasileira (FAB) de serem reabastecidos em pleno voo por jatos KC-390 Millenium. Na prática, tanto a FAB quanto os fabricantes dos caças e do avião reabastecedor saíram com saldo positivo.
Para a Saab, a missão significa demonstrar as capacidades plenas da nova versão do Gripen. Até o momento, o Gripen E foi selecionado pelas forças aéreas do Brasil, Suécia, Tailândia, Colômbia, Peru e Ucrânia, estando em serviço nos dois primeiros países. Apesar da capacidade operacional elevada e tecnologia de ponta, uma das principais críticas é o raio de ação, inferior a outras opções no mercado, como o Typhoon, o Rafale ou o F-18 Super Hornet. Ao mostrar o reabastecimento em voo do seu caça, a Saab ganha mais um argumento de venda.
“A ratificação da capacidade de reabastecimento em voo é um marco técnico muito significativo para o nosso negócio, pois demonstra que o Gripen E alcançou um novo nível de alcance operacional. O sucesso desta campanha reforça ainda mais a parceria estratégica entre o Brasil e a Suécia e o papel do Brasil dentro do ecossistema global do programa Gripen”, disse Mikael Olsson, chefe de Testes de Voo da Saab. A Autoridade Sueca de Aviação Militar poderá agora revisar as evidências de verificação da capacidade de reabastecimento em voo do Gripen E como parte de seu processo de certificação. Em seguida, será realizado o processo de certificação conduzido pelo Instituto de Fomento e Coordenação Industrial (IFI), da FAB.

A Embraer também sai mais forte da Operação Samaúma. O KC-390 Millenium já era qualificado para reabastecer outros KC-390 e os F-5 e A-1 da FAB. Porém, estes dois jatos são de projeto antigo, estando fora do mercado – a FAB é uma das últimas operadoras dos F-5 e a única dos A-1. Já o Gripen, principalmente em sua versão Gripen E, mais recente, é um caça com espaço a ser conquistado no mercado. Além do Brasil, a própria Força Aérea da Suécia, que também vai operar o KC-390, se beneficia com o sucesso. Outros futuros operadores do Gripen podem ver o cargueiro brasileiro como uma opção atrativa para suas forças aéreas.
“Este importante marco confirma as qualidades incomparáveis do KC-390 como aeronave reabastecedora e fortalece ainda mais nossa parceria com a Saab e com a Força Aérea Brasileira. Além disso, a capacidade multimissão única oferecida pelo KC-390, que permite converter o avião em um reabastecedor em questão de horas, oferece flexibilidade incomparável para as Forças Aéreas em todo o mundo”, disse Walter Pinto Júnior, Vice-Presidente de Operações da Embraer Defesa & Segurança. Conforme os comunicados oficiais, os sistemas fly-by-wire de última geração de ambas as aeronaves contribuíram para a operação bem-sucedida, com o KC-390 fornecendo uma esteira aerodinâmica considerada favorável e o Gripen E demonstrando uma resposta em voo classificada como excelente.
Chamou a atenção as fotos distribuídas para a imprensa apresentar o KC-390 Millenium com a nova pintura comercial da Embraer, em cores acinzentadas.

Aumento da capacidade operacional
Quanto à FAB, na prática, amplia-se significativamente a capacidade de defesa da soberania aeroespacial brasileira. A escolha do Gripen E como novo caça sofreu críticas por questão de alcance, especialmente no contexto em que o Brasil possuía apenas um par de KC-130 Hércules capazes de transferir combustível em voo. Com a perspectiva de operação de 19 KC-390, ampliam-se as possibilidades operacionais.
Com o suporte da aeronave KC-390 Millennium, o Gripen pode, com apenas um reabastecimento, alcançar em poucas horas qualquer ponto do território brasileiro, incluindo regiões fronteiriças distantes, a cerca de 3.000 da Base Aérea de Anápolis (BAAN), casa dos caças F-39E Gripen. Se necessário, a FAB também pode deslocar caças para operações em áreas de interesse, onde ganha no tempo de permanência em missões de Patrulha Aérea de Combate, por exemplo, podendo orbitar por horas, graças ao reabastecimento em voo.
“Esta campanha coroa um ciclo de desenvolvimento tecnológico, evidenciando o resultado de esforços integrados em prol da soberania e da inovação do país”, destacou o coordenador-geral da Operação Samaúma, por parte da FAB, Coronel George Luiz Guedes de Oliveira. “Uma campanha de ensaios em voo representa um ambiente complexo e desafiador. Para um profissional da área técnica, como eu, participar de uma operação dessa natureza é repleto de aprendizados, especialmente pela interação com duas fabricantes de grande porte e renome internacional, como a SAAB e a Embraer”, completou um dos pilotos de ensaio da FAB, Tenente-Coronel David Escosteguy.
Traslados ainda ocorrem por via marítima
A novidade pode mudar a chegada das aeronaves ao Brasil. No dia 14 de novembro, chegou ao porto de Navegantes (SC), mais um F-39E Gripen brasileiro, com matrícula FAB 4111. Fabricado na Suécia, o caça veio a bordo do navio Fortunagracht, de bandeira dos Países Baixos.
A possibilidade de reabastecimento em voo poderá livrar a FAB e a Saab deste procedimento, cheio de complexidades e riscos. Só o tempo no mar é de 20 dias, sendo necessário haver cuidados específicos para o transporte da carga ao longo de dez mil quilômetros.

Além disso, ao chegar ao Brasil, o caça ainda precisa passar por instalação de kit de sobrevivência e assento ejetável, abastecimento e preparo de acionamento em solo. Isso envolve até o transporte terrestre pelas ruas da cidade de Navegantes até o aeroporto local. Só então é realizado o voo até a Base Aérea de Anápolis.
O mesmo procedimento será necessário, até o momento, para outras entregas de caças Gripen E pela Saab. Em situações de conflito, por exemplo, haveria ainda o risco de ataque ao navio de transporte.
LEIA TAMBÉM:
KC-390 made in Índia: Brasil avança para ampliar cooperação
Embraer dá novo visual para o KC-390 Millenium
Portugal começa a ter protagonismo nas exportações do KC-390
VEJA TAMBÉM:










Comentar